Transcricao de introns em genes humanos
Estudo realizado na USP identificou que 74% de todos os genes humanos possuem transcrição dentro de seus íntrons. A descoberta, publicada na edição atual da revista Genome Biology, poderá ajudar a entender melhor as prováveis funções reguladoras dos genes exercida pelos RNAs não-codificantes, que por muito tempo foram considerados “lixo genético”.
Os íntrons são seqüências de bases nitrogenadas presentes no DNA, mas não no RNA mensageiro (mRNA). Ao contrário dos éxons, com os quais se intercalam na longa cadeia do DNA, os íntrons não participam da síntese de proteínas e são removidos naturalmente durante a transcrição.
A equipe, coordenada por Sérgio Verjovski-Almeida, professor do Instituto de Química da USP, encontrou mais de 55 mil RNAs intrônicos em cerca de 5 milhões de etiquetas de seqüências expressas (ESTs) depositados em bancos de dados genômicos públicos.
“Em 74% dos genes, além do RNA codificador de proteínas são transcritos também um ou mais RNAs não-codificadores a partir de regiões totalmente contidas nos íntrons desses genes”, disse o pesquisador à Agência FAPESP.
Os cientistas desenharam e construíram um microarray (lâminas preparadas com um arranjo de fragmentos de DNA) contendo sondas para 7.135 desses RNAs intrônicos, além de sondas para os genes codificadores das proteínas correspondentes. Com isso, detectaram padrões característicos da expressão intrônica para tecidos diferentes, como próstata, rim e fígado.
Segundo Verjovski-Almeida, o trabalho aponta para um papel importante dos RNAs não-codificadores de proteínas na regulação dos diversos tipos de células. “Descobrimos que os RNAs intrônicos anti-senso mais abundantes são transcritos dentro dos íntrons dos genes codificadores de proteínas que regulam a transcrição. Isso sugere que esses RNAs anti-senso são os reguladores dessas proteínas”, apontou.
Os pesquisadores imaginavam que o RNA transcrito de regiões intrônicas dos genes estivessem envolvidos em diversos processos relacionados com o controle da expressão genética. Mas não se conhecia o complemento dos genes humanos nos quais os íntrons são transcritos, o número de unidades transcricionais ou os padrões de expressão nos tecidos.
“Levantou-se, recentemente, a hipótese de que haveria unidades totalmente contidas nas regiões intrônicas. Isso foi constatado em alguns genes, em determinadas regiões do genoma. Começamos a ver, a partir desse novo trabalho, que não se trata de um acontecimento ocasional restrito a alguns genes. É possível até que todos os genes tenham transcrição intrônica independente da transcrição da mensagem”, disse Verjovski-Almeida.
Diversidade das espécies As células têm mecanismos para identificar em seu genoma que certos genes devem ser ativados ou desativados em determinado momento. Depois de conhecido o genoma, seria importante descobrir onde estão os genes e, para isso, é preciso seqüenciar vários tipos de células em vários momentos, para verificar que genes estão ligados ou desligados.
“Geramos um microarray de 7 mil dos mais de 55 mil RNAs intrônicos não-codificantes que encontramos. Identificamos mensagens intrônicas e exônicas em tecidos do fígado, próstata e rim. Havia um conjunto de mensagem intrônicas em comum e uma fração menor de algumas centenas que acendem em um tecido e não nos outros, sugerindo uma relação com a regulação de funções específicas de cada tecido”, disse Verjovski-Almeida.
Ao analisar que tipo de gene tem mais presença da transcrição intrônica, os pesquisadores descobriram que são justamente os genes reguladores de transcrição. “São reguladores da própria máquina de transcrição – isto é, uma espécie de regulação fina feita pelo RNA. Está claro que os transcritos intrônicos devem ter algum papel e podem agir eventualmente até em proteínas”, afirmou.
Para Verjovski-Almeida, é possível que os RNAs intrônicos estejam relacionados à diversidade das espécies. “Uma indicação disso é que o número de genes nos organismos superiores não cresceu muito com a evolução. Uma mosca tem 25 mil genes codificantes de proteína, enquanto o homem tem 30 mil. O que varia significativamente entre as espécies são as regiões intrônicas, por isso faz sentido conjecturar que a diversidade vem daí”, sugeriu.
Segundo ele, seria preciso seqüenciar o genoma de milhares de pessoas para avaliar essa hipótese. Com isso, seria possível também explicar a suscetibilidade de indivíduos a determinadas doenças. “Para muitas doenças se encontrou mutações nas regiões codificantes. Mas não há vestígios de mutações nessas regiões para várias doenças complexas, que podem estar nessa outra rede”, disse.
Fontes:
Genome mapping and expression analyses of human intronic noncoding RNAs reveal tissue-specific patterns and enrichment in genes related to regulation of transcription. Verjovski-Almeida S. et al. Genome Biology 2007, 8:R43.
Agencia FAPESP
Genoma do macaco rhesus sequenciado
Um consórcio internacional acaba de anunciar o seqüenciamento do genoma do macaco rhesus (Macaca mulatta). A espécie, que divergiu dos ancestrais do homem moderno há cerca de 25 milhões de anos, é agora o terceiro primata com o código genético desvendado. O genoma humano foi seqüenciado em 2001 e o do chimpanzé (Pan troglodytes) – que divergiu dos humanos há 6 milhões de anos – em 2005.
As pesquisas que levaram ao seqüenciamento, realizadas por mais de 170 cientistas em 35 instituições de diversos países, tiveram seus resultados publicados em cinco artigos na edição desta sexta-feira (13/4) da revista Science.
Em linhas gerais, a seqüência do genoma do rhesus coincide com as dos humanos e dos chimpanzés em 97,5%. A semelhança entre os códigos genéticos do chimpanzé e do humano chega a 99%.
Para os cientistas, além de representar uma importante contribuição para pesquisas na área de saúde, o primeiro seqüenciamento de um macaco do velho mundo pode ajudar a compreender melhor o próprio homem.
De acordo com o coordenador da pesquisa, Richard Gibbs, do Centro de Seqüenciamento do Genoma Humano da Escola Baylor de Medicina, nos Estados Unidos, a comparação dos três genomas de primatas será importante para pesquisas em evolução, neurociências, biologia comportamental, fisiologia reprodutiva, endocrinologia e estudos cardiovasculares.
“O genoma do macaco rhesus ajudará a compreender o que foi acrescentado ou apagado na linha evolutiva dos primatas, passando dessa espécie para o chimpanzé e para o humano. Isso é importante para entender o que faz de nós humanos”, afirmou Gibbs.
Os pesquisadores identificaram cerca de 200 genes que mostram evidências de seleção positiva durante a evolução, tornando-os potenciais candidatos para determinar as diferenças entre espécies primatas. Esses genes estão envolvidos com a formação de pêlos, resposta imune, proteínas de membranas e fusão entre ovo e esperma.
Pela abundância de espécimes e pela semelhança genética e fisiológica com os humanos, o macaco rhesus é utilizado freqüentemente na pesquisa biomédica. A espécie é conhecida por seu papel em estudos que determinaram o fator RH e a vacina da poliomielite, além de serem importantes para a pesquisa sobre doenças neurológicas e comportamentais.
Justamente por isso, segundo os artigos, os pesquisadores ficaram surpresos ao descobrir que algumas formas normais das proteínas do macaco são semelhantes às proteínas humanas com patologias. O principal exemplo é a fenilcetonúria, que pode levar a danos cerebrais e retardamento mental em humanos ao causar defeito em uma determinada enzima.
O DNA utilizado para o seqüenciamento do genoma do rhesus foi retirado de uma macaca da Fundação Southwest para Pesquisa Biomédica, de San Antonio, no Texas.
Fontes:
Evolutionary and Biomedical Insights from the Rhesus Macaque GenomeRhesus Macaque Genome Sequencing and Analysis Consortium, Gibbs et al. Science 13 April 2007: Vol. 316. no. 5822, pp. 222 - 234
Agencia FAPESP
Gene de hormonio do crescimento

Mutações em gene de hormônio do crescimento perpetuam as raças de cães de porte reduzido.
O cachorro doméstico (Canis familiaris) tem a maior diversidade de tamanhos entre os mamíferos hoje existentes, característica que há tempos intriga os cientistas. Mas agora pesquisadores norte-americanos e britânicos acreditam ter encontrado a resposta para essa questão: eles identificaram um trecho do genoma canino que faz com que cachorros de raças pequenas mantenham o porte reduzido. A equipe de Nathan Sutter, do Instituto Nacional de Pesquisas sobre o Genoma Humano (EUA), descobriu que animais de raças pequenas carregam uma ou mais mutações num gene, o IGF1 (Insulin-like Growth Factor), que produz um hormônio associado ao crescimento de seres humanos e de outros mamíferos. As alterações genéticas fazem com que os animais tenham em seu sangue uma quantidade menor desse hormônio e continuem para sempre com suas dimensões reduzidas. O gene IGF1 fica no cromossomo 15 dos cães.
“Todos os cachorros com menos de 10 quilos têm essa seqüência alterada, todos eles. Isso é extraordinário”, diz K. Gordon Lark, da Universidade de Utah (EUA), um dos autores do trabalho. O Rottweiler é uma exceção à regra: apesar de grande, a raça também tem o trecho de DNA que caracteriza cães pequenos. Isso leva a crer que há outros fatores genéticos, ainda não descobertos, que também influem no tamanho dos cães.
Os estudos se iniciaram com o cão d’água português, raça cujo tamanho varia muito. Os autores contaram com a ajuda de centenas de donos de cães em todos os EUA para obter amostras de DNA e medidas de mais de 500 cães dessa raça. A análise desses dados levou à descoberta da região em que o gene que controla o tamanho do corpo dos animais se encontrava. Para confirmar a hipótese de que as mutações no gene IGF1 eram importantes para determinar o porte dos cães, o estudo foi expandido para outras raças. No total, foram analisados os genomas de 3.241 cães de 143 raças, desde as de menor porte, como o chihuahua e o pequinês, até as de tamanho avantajado, como o são-bernardo e o mastim.
De acordo com os pesquisadores, os cães de pequeno porte podem ter surgido em razão de uma dificuldade adaptativa de lobos selvagens pertencentes a raças de dimensões reduzidas, que não podiam sobreviver na natureza, mas se deram bem ao lado do homem. Outra teoria sustenta que a origem dos pequenos cães pode ser fruto de uma escolha de nossa espécie: os humanos que domesticaram os primeiros cachorros podem ter simplesmente preferido criar animais de porte menor.
Fontes:
A Single IGF1 Allele Is a Major Determinant of Small Size in Dogs. Sutter et al. Science 6 April 2007: Vol. 316. no. 5821, pp. 112 - 115.
Revista Pesquisa FAPESP.